O mal e o feio na arte: contribuições de Santo Agostinho

22/12/2019

     Santo Agostinho trouxe uma contribuição valiosa para a estética com suas reflexões sobre a presença do mal e feio no campo estético; parece que, de modo explícito, sistemático e consciente, foi essa a primeira vez em que isso aconteceu nos estudos antigos de estética. Para chegar a isso, Santo Agostinho partiu da fórmula aristotélica de que a beleza é unidade na variedade. Para os gregos, a variedade de partes de que se fala aí é sempre uma variedade de partes belas. Se atentarmos bem para a arte grega - principalmente as literárias - veremos que os poetas e os dramaturgos nunca se preocuparam muito com isso, usando, sem maiores preocupações, o mal e o feio, ao lado do bem e belo, como assunto de suas obras. Mas os pensadores parecem que, ao refletir sobre a beleza, punham sua atenção mais aguda sobre as artes plásticas. E como a escultura grega era uma arte quase que só do belo puro, os pensadores gregos tinham aquela tendência, a identificar o belo com a beleza, considerando-o a única forma legítima de beleza. Santo Agostinho, porém, aprofunda a fórmula da unidade na variedade, levando-as às consequências últimas; isto é, diz ele que a variedade não deve abranger somente as partes belas de um todo; admite a oposição dos contrários, dos contrastes mais violentos, entre as partes belas e feias, partes pertencentes ao bem e partes pertencentes ao campo do mal. Assim, a beleza de uma obra de arte que tem partes feias ou obscenas integrando seu todo decorre da unidade a que, nela, o mal e o feio são remetidos, juntamente com seus contrários. Para chegar a essa ideia de legitimidade do mal e do feio na obra de arte, Santo Agostinho partiu de suas reflexões do mal e do feio no próprio mundo e na vida, no universo. Ele faz referência expressa à "beleza do universo, a qual, por disposição de Deus, se faz ainda mais patente pela oposição dos contrários". Assim, o feio entra pela primeira vez como legítimo no campo estético, admitido como fator de valorização do belo, e ambos aptos a fornecer assunto para criação da beleza.

Fonte: Iniciação à estética. Autor: Ariano Suassuna.

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